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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE APOIO À INICIAÇÃO CIENTÍFICA DO AMAZONAS
EROSÃO E DEPOSIÇÃO NO LIMITE DA COSTA DO REBOJÃO COM A
COSTA DA TERRA NOVA, ILHA DO CAREIRO-AM, E AS
MANIFESTAÇÕES NA ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO
Bolsista: Luciana Cosme Maia, FAPEAM
MANAUS
2015
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
PRÓ-REITORIA DE PESQUISA E PÓS-GRADUAÇÃO
DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA
PROGRAMA DE APOIO À INICIAÇÃO CIENTÍFICA DO AMAZONAS
RELATÓRIO FINAL
PIB-H/0142/2014
EROSÃO E DEPOSIÇÃO NO LIMITE DA COSTA DO REBOJÃO COM A
COSTA DA TERRA NOVA, ILHA DO CAREIRO-AM, E AS
MANIFESTAÇÕES NA ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO
Bolsista: Luciana Cosme Maia, FAPEAM
Orientador: Profº Drº José Alberto Lima de Carvalho
MANAUS
2015
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Resumo
Este trabalho teve como objetivo compreender as diferentes manifestações na organização do
espaço geográfico existente no limite superior da Ilha do Careiro, em função do intenso
processo das terras caídas na costa do Rebojão e consequente deposição a jusante na costa da
Terra Nova. Observou-se que na costa do Rebojão, onde predomina o intenso processo de
erosão lateral, a população é bem rarefeita enquanto que na mesma margem, mas na curva
seguinte há uma grande concentração de moradores, evidenciando uma clara influência da
hidrodinâmica do rio Amazonas na organização do espaço. A ocorrência de poucos moradores
na costa do Rebojão deve-se aos riscos de vida em função das terras caídas, enquanto que na
margem de deposição os mesmos se sentem mais protegidos, além de utilizarem as “terras
novas” na prática agrícola. A metodologia da pesquisa consistiu em trabalho de gabinete e in
locu. Em gabinete foi realizado sobreposição de imagem de satélite LANDSAT com
fotografia aérea do ano de 1952. Em campo foram realizadas entrevistas com moradores,
registro fotográfico e medições batimétricas. A sobreposição da imagem do satélite
LANDSAT com os mosaicos de fotografias aéreas registradas no ano de 1952 nos permitiram
observar e mensurar a intensidade com que o rio Solimões/Amazonas adentrou na costa do
Rebojão. A memória dos moradores antigos da área confirma a velocidade com que o rio
Amazonas chegou ao lago do Joanico, cuja distância do mesmo para o rio
Solimões/Amazonas era de 1.450m em 1952 até 2010. A pesquisa constatou que a diferença
na forma de ocupação do espaço está estritamente relacionada com a dinâmica fluvial. A
raridade de moradores na costa do Rebojão se explica pela dificuldade de acesso ao rio devido
a margem ser muito íngreme e pelos riscos de vida que as terras caídas oferecem aos
moradores, enquanto que na costa da Terra Nova a situação é inversa. Ali os moradores se
sentem seguros do ataque do rio.
Palavras chaves: Terras novas, terras caídas, ribeirinhos, dinâmica fluvial.
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LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Mapa de localização da área de estudo 7
Figura 2 – Mapa geomorfológico da ilha do Careiro 24
Figura 3 – Comunidade no período da cheia 25
Figura 4 – Comunidade no período da cheia 25
Figura 5 – Ecobatimetro 25
Figura 6 – Sensor 25
Figura 7 – Mapa de sobreposição de imagens 27
Figura 8 – Plantio de hortaliça na restinga nova 28
Figura 9 – Moradias na restinga antiga. 28
Figura 10 – Paisagem comum na costa do Rebojão 28
Figura 11 – Casas ameaçadas pelas terras caídas 28
Figura 12 – Mapa de sobreposição de imagens 30
Figura 13 – Perfil transversal do encontro das águas 31
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO 6
2. REVISÃO DE LITERATURA 9
2.1 – Costa do Rebojão e Costa da Terra Nova: um espaço diferenciado pela
relação homem natureza
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2.2 – Dinâmica Fluvial
2.3 – Tipos de rios da Amazônia
2.4 – Planície de Inundação
2.5 – Costa do Rebojão (AM)
2.6 – Comunidade Terra Nova (AM)
3. METODOLOGIA
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4. RESULTADOS
5. CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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CRONOGRAMA 33
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INTRODUÇÃO
Uma das características mais marcantes na paisagem das margens do rio Amazonas e
de seus afluentes de água branca, como o rio Madeira, por exemplo, é a intensa mudança que
ocorre em período muito curto, normalmente de um ano para outro. É normal você conhecer
um lugar em um ano e no ano seguinte não reconhecer mais devido a rápida mudança
provocada pela dinâmica fluvial.
Neste sentido e com o objetivo de estudar as diferentes manifestações na organização
do espaço geográfico é que elegemos o limite superior da Ilha do Careiro, mais precisamente
no trecho que limita a costa do Rebojão com a Costa da Terra Nova. Nesse trecho selecionado
as diferentes formas de ocupação pelos moradores, em função da dinâmica fluvial, se presta
como um “laboratório” para se estudar a relação do homem com a natureza como bem fez o
professor Hilgard O’Reilly Sternberg em final dos anos de 1948/9.
A pesquisa consistiu numa análise interpretativa das diferentes formas de ocupação do
espaço geográfico existente no limite da Costa do Rebojão com a Costa da Terra Nova. A área
de estudo localiza-se na parte superior da ilha do Careiro, pertencente ao complexo sistema
fluvial da confluência dos rios Solimões/Amazonas com o rio Negro. Na costa do Rebojão o
processo de erosão lateral (fenômeno terras caídas) é muito intensa devido à ação das
correntes turbilhonares do rio Solimões, causando o desbarrancamento acelerado da margem.
O grande volume de material retirado desse trecho é depositado na mesma margem, porém na
curva seguinte (margem convexa) formando as barras laterais que no processo contínuo de
crescimento passa a ser em muitos casos incorporada ao díque mais antigo e
consequentemente ocupada por moradores. A costa do Rebojão (de rebojo, turbulência) é
quase que desabitada devido às dificuldades de moradia e riscos para os moradores devido o
intenso desbarrancamento das margens, enquanto que a costa da Terra Nova (novas terras), na
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mesma margem, é densamente povoada pois ali os moradores estão protegidos das ameaças
das terras caídas.
As mudanças ocorridas na área da pesquisa consistiram na análise espaço-temporal
obtidas a partir de sobreposição de imagens de satélite LANDSAT com fotografia aérea
(Figura 1), trabalho de campo com registro fotográfico, medição batimetria transversal na
confluência dos rios Amazonas e Negro e entrevistas com moradores. Dentre outras
atividades de pesquisas realizadas nesse período estão às leituras e levantamentos
bibliográficos sobre o tema, para aprofundar a reflexão a relação da sociedade com a natureza,
pois o tema possui pouca produção acadêmica diante dessa realidade Amazônica. Importante
ressalvar as disciplinas cursadas, relevantes para o desenvolvimento da pesquisa: Evolução do
Pensamento Geográfico, Geografia Urbana, Geografia Agrária, Geomorfologia Fluvial,
Geografia Física da Amazônia, Geografia Humana da Amazônia, Metodologia da Pesquisa
em Geografia, Sensoriamento Remoto e Cartografia; das quais sem elas não seria possível um
entendimento sobre o tema.
Figura1: Mapa de localização da área de estudo.
Fonte: Google Earth. Org. André Zumak, 2015.
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O estudo possibilitou trabalhar a Geografia Física e Humana, buscando ampliar
interesse e compreensão do processo natural e complexo existente na Amazônia, que muda a
vida dos moradores ribeirinhos, da qual se perde muito pela pouca produção acadêmica
existente sobre do assunto.
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2. REVISÃO DE LITERATURA
Serão abordados os fundamentos teóricos conceituais mais importantes para a
compreensão das escolas geográficas, processos fluviais, particularmente a erosão de margem
e deposição de sedimentos, os impactos causados nas comunidades e uma revisão da literatura
relacionada com o tema.
2.1 Costa do Rebojão e Costa da Terra Nova: um espaço diferenciado pela relação
homem-natureza
O homem desde sempre tem em sua condição, uma íntima relação entre o ser e o
espaço vivido por ele, a humanidade com ligação de desejo e necessidade de conhecer seu
espaço, tal como explorar os outros, acrescenta em si os conhecimentos vividos e
conquistados ao longo do tempo, com reflexões da sociedade e do espaço.
A geografia se molda na complexidade entre o tempo, homem e espaço, refletindo no
mundo a evolução da história da humanidade. Trás consigo as técnicas, construções do
espaço, as relações humanas com grandes desafios em que a ciência avança e limita.
(CORRÊA, 2000).
As principais correntes de pensamento geográfico nos ajudam a entender uma
sequencia histórica de práticas teóricas, políticas e empíricas, sem excluir nenhuma, pois
apresentam a cada momento um ou dois padrões dominantes.
A partir de 1870 a geografia emerge como uma disciplina acadêmica vai crescendo
tomando forma mais especifica, sem perder a visão da realidade de forma global. No final do
século XIX, com a passagem do capitalismo para a fase monopolista e imperialista, o
determinismo foi o primeiro padrão a caracterizar a geografia. (CORREA, 2000).
Os defensores do determinismo afirmavam que as condições naturais, principalmente
a climática (temperatura, e suas variações ao longo das estações) determinavam o
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comportamento do homem, intervindo na capacidade de avançar. Assim a natureza atuaria
diretamente na expansão de um povo em condições climáticas mais favoráveis. (CORREA,
2000).
Friedrich Ratzel foi o representante engajado nesse tema das influências da natureza
sobre o homem (citado por MORAES, 1999). “Para ele a sociedade é um organismo que
mantém relações duráveis com o solo, manifestas, por exemplo, nas necessidades de moradia
e alimentação” (MORAES, 1999, p. 56). Pois para ser livre o homem utilizaria os recursos da
natureza, e o crescimento seria o maior uso dos recursos do meio, criando uma relação estreita
com a natureza.
O determinismo de Ratzel se justificava no aumento e necessidade de expansão
territorial, com criações de colônias de exploração e povoamento em regiões com climas
temperados. Observa-se que o determinismo Ratzeliano passou a se configurar como uma
ideologia das classes sociais dominantes e de povos ou países vencedores. Seus discípulos
radicalizaram as colocações por ele levantadas, ao ponto de se formar uma verdadeira “escola
determinista” de Geografia, passando a ser denominada de determinismo geográfico.
Os autores dessa corrente ratzeliana definiram o objeto da reflexão geográfica, onde a
máxima está em como as “condições naturais determinam a História”, ou como a afirmativa
da geógrafa americana Ellen Semple que levou ao estremo o Determinismo ao afirmar que “o
homem é um produto do meio”, diminuindo bastante as formulações de Ratzel. Uma vertente
vinda das formulações de Ratzel foi a escola ambientalista. “Essa corrente propõe o estudo do
homem em relação aos elementos do meio em que ele se insere. O conjunto dos elementos
naturais é abordado como ambiente vivenciado pelo homem” (MORAES, 1999, p.58).
Algumas heranças do discurso ideológico determinista são as expressões fator
geográfico e condições geográficas, que se entende como clima, vegetação, relevo, etc. Com
isso uma relação causal entre o comportamento humano e a natureza, sendo um elemento de
11
determinação. Para Ratzel, o território aumentaria pela necessidade de progresso, conquistar
novas áreas. E em justificativa dessas colocações elabora o conceito de “espaço vital”; como
equilíbrio entre os recursos disponíveis em suprir as necessidades da população de uma
sociedade, sendo uma definição de potencial em crescer com rapidez seus territórios.
O espaço vital implicitamente encontra-se ligado na organização espacial, marcando
na área do capitalismo, parte dessa organizada pelo capital e pelo Estado capitalista extensão
necessária para a reprodução do mesmo, ou seja, espaço vital igual à expressão espaço do
capital.(CORRÊA, 2000)
Assim a “Geografia proposta por Ratzel abriu várias frentes de estudo, valorizando
questões referentes à História e ao espaço” (MORAES, 1999, p.57). Algumas linhas de
estudos são: formação de território, distribuição dos povos e das raças na superfície terrestre,
migrações, colonizações, as consequências do isolamento. Contudo o enfoque e objeto central
é o estudo das influências, que as condições naturais desempenham sobre a evolução das
sociedades.
Se contrapondo ao Determinismo geográfico Ratzeliano surgiu em final do século
XIX, inicialmente na França e em seguida na Alemanha, e nos Estados Unidos o que se
passou a chamar de Possibilismo. Com semelhança ao determinismo, esse modelo enfoca nas
relações entre o homem e o meio natural, porém não faz uma determinação da natureza ao
comportamento do homem, mas abre a possibilidade do homem em se adequar ao ambiente
natural a partir principalmente do uso das técnicas a serem utilizadas.
A reação ao determinismo foi mais forte na França por motivação externa devido ao
confronto entre ela e a Alemanha. Originalmente o possibilismo francês em sua origem se
opõe ao determinismo germânico, fundamentada na diferença entre os dois países. A França
já era França há muito tempo, enquanto Alemanha foi unificada tardiamente em 1871. A
revolução burguesa foi de modo mais completo na França, destruindo os restos feudais, porém
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ainda existentes na Alemanha, chegando tardiamente à corrida colonial, enquanto a França
possuía um vasto império; os alemães voltaram seus interesses de expansão na maioria para a
própria Europa.
A França diante de todo o contexto tinha para cumprir várias etapas: criticar o conceito
de espaço vital, porém sem torna-se inviável intelectualmente o colonialismo francês; acabar
com qualquer forma de determinação, seja ela da natureza ou não, com uma nova ideia de que
as ações humanas são marcadas pela sucessão; persistir na fixação do homem e suas obras
criadas em processo de transformação da natureza.
Paul Vidal de la Blache, mestre do possibilismo, considerava as relações entre homem
e a natureza complexas; a entender que foi levado em consideração a natureza como
fornecedora de possibilidades onde o homem modificaria se tornando o principal agente
geográfico. Com esse direcionamento ele redefine o conceito de gênero de vida legado do
determinismo.
Vidal de La Blache não esqueceu a sua visão em parte naturalista, argumenta
fielmente que: “a Geografia é uma ciência dos lugares, não dos homens” (MORAES, 1999,
p.67). Afinal o interesse para análise está no resultado da ação humana na paisagem e não em
si mesma. Com sua visão buscou ir além das descrições de viagens, surgindo uma nova
Geografia, a escola francesa; com objeto da geografia sendo a relação do homem-natureza, na
perspectiva da paisagem, onde homem é ativo sofrendo influencia do meio, mas atuando
sobre ele e transformando-o.
A perspectiva vidaliana, é de que “a natureza passou a ser vista como possibilidades
para ação humana” (MORAES, 1999, p.68). Com o homem se adaptando em vários lugares
de acordo com o meio que se envolvia, onde o relacionamento fica constante, criando
técnicas, muitos hábitos, costumes e usos, diante dos recursos naturais disponíveis, dando um
nome de “gênero de vida”, referência à relação da população com os recursos. Neste sentido o
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homem tem a capacidade de interferir e mudar o ambiente, várias causas estão relacionadas
para essas mudanças.
2.2 Dinâmica Fluvial
Na Amazônia brasileira, particularmente nas margens dos rios de água branca onde a
dinâmica fluvial é muito intensa, os ribeirinhos vem ao longo de gerações demonstrando uma
capacidade de se adaptar ao ambiente em que está em constante alteração, onde conseguem se
ajustar em diferentes condições naturais.
O trecho limítrofe entre a Costa do Rebojão e Costa da Terra Nova, local selecionado
para o estudo, se prestou muito bem para retomar essa discussão haja vista que se trata de uma
mesma margem, mas com expressiva diferença na forma de ocupação pelos moradores.
É evidente que a dinâmica dos rios afeta comunidades ribeirinhas e até países. E, como
sociedade e natureza são relacionadas, os fenômenos naturais afetam diretamente nas
dinâmicas sociais, como em alguns municípios do Amazonas, por exemplo, Manaus, no início
de sua colonização. Dependendo do tipo de rio, vegetação e clima, as atividades humanas
também são transformadas, assim como, as atividades humanas também podem alterar alguns
aspectos físicos da paisagem, como o uso do solo, desmatamento, erosão causada por agentes
antrópicos, dentre outras transformações físicas.
No rio Amazonas, por ser uma drenagem ainda muito jovem e localizada na região
equatorial, onde o regime pluvial é muito intenso, faz com que os processos fluviais adquiram
características intensas responsáveis por grandes mudanças geomorfológicas, tanto dentro dos
canais como na grande área de transbordamento (ROZO. 2004; CARVALHO, 2006; 2012,
CARNEIRO, 2009).
A água e sua relação com a sociedade humana é indispensável para a presença do
homem, no Careiro ou em regiões semelhantes possuem características e aspectos
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importantes, além de produzir ambiente favorável para habitação. Sternberg descreve bem
sobre isso,
“A água como substancia primordial, seu significado para a comunidade toma
maior relevo e assume aspectos muito especiais, ela atua tanto de maneira indireta,
quanto direta. Sua influencia imediata se faz sentir através da base mesma da
ocupação – o solo – de que é autora, e no qual criou tratos muito desiguais, quanto
as possibilidades de aproveitamento” (Sternberg, 1998, pág.15)
Para Suguiu e Bigarella (1990, p.27), “o trabalho total de um rio é medido pela
quantidade de material que ele é capaz de erodir, transportar e depositar”.
Os processos de erosão, transporte e deposição de sedimentos são processos
dependentes entre si e não podem ser entendidos de forma isolados. Alternam-se no decorrer
do tempo, mutáveis do fluxo e carga existentes. A erosão fluvial que acontece com
intensidade no curso superior, é resultante da velocidade e turbulência do fluxo, assim como
as características das partículas, posteriormente transportadas e depositadas.
Sobre erosão de margem autores como Chistofoletti (1981, p. 236); Suguio e Bigarella
(1990, p. 71); Cunha (1995, p. 231), conceituam erosão fluvial como sendo o processo de
retirada de material do fundo e das margens de um canal e que acontece, segundo os autores,
através do processo de corrosão, corrasão (ou abrasão) e cavitação.
A corrasão é o melhor conceito a se enquadrar para o rio nessa região, ao que se refere
ao atrito mecânico do material transportado, esclarecido por Suguio & Bigarella (1990, p. 27),
que afirmam que “a capacidade de erosão de um rio depende, das partículas por ele
transportadas, do que do volume de água”. Contudo Christofoletti (1981, p. 236), mostra com
certo cuidado sobre essa capacidade abrasiva, afirmando que “A carga em solução e a em
suspensão não possuem poder abrasivo [...] age mais como polimento do que como agente
ativo na erosão regressiva dos cursos de água”. Por ser um rio de água branca é considerado
muito instável, pois estão constantemente transportando seus sedimentos e mudando seus
leitos, influenciando o modo de vida dos moradores ribeirinhos. “Sobressai a água,
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exclusivamente sua atividade que derivam as formas do terreno e a ela se vincula ainda, direta
e indiretamente, a fisionomia vegetal da área” (Sternberg, 1998, pág. 243).
Ainda sobre o assunto Christofoletti (1981, p.235), entende que “a erosão fluvial
engloba os processos de retirada de detritos do fundo do leito e das margens, fazendo com que
possam se integrar à carga sedimentar”.
A erosão está diretamente ligada com transporte de sedimentos. De acordo com
Christofoletti (1981), a força de cisalhamento, corresponde a força necessária para carregar as
partículas e a velocidade da erosão, correspondendo a velocidade na qual a força de
cisalhamento atua sobre uma determinada declividade, senso decisivas para erodir e iniciar o
movimento dos sedimentos.
Para Cunha (1995), a descarga de um rio vazão, tem um papel muito importante no
processo de erosão e deposição de sedimentos em rio. É a vazão que define a competência de
um rio, que corresponde ao tamanho máximo do material que pode ser transportado, e a
capacidade do rio, que diz respeito ao volume de carga que pode ser transportado.
Para Christofoletti (1981), a carga detrítica de um rio é composta por partículas de
variadas propriedades, tamanhos e formas diferentes, sendo três tipos de carga: carga
dissolvida, carga de leito e carga em suspensão.
Os tipos de transporte de sedimentos são de grande importância nos canais fluviais na
configuração dos depósitos fluviais. Para Suguiu e Bigarella (1990), pode-se agrupar em três
categorias: O transporte por tração, que está relacionado às tensões tangenciais ao longo do
fundo da corrente, provocados pela água em movimento. O transporte por saltação, que é
uma forma na qual as partículas avançam ao longo do leito do leito fluvial, através de uma
serie de saltos curtos, sendo considerado como uma fase intermediária entre transporte por
tração e em suspensão. E o transporte em suspensão, são sedimentos de tamanho reduzido e
são transportados quando a intensidade da turbulência é maior que a velocidade de deposição.
16
Para Suguiu e Bigarella (1990), terras novas (deposição) são depósitos de acreção
lateral (depósito de canal) e acreção vertical (deposito de transbordamento) muito intenso no
rio Amazonas e na sua área de transbordamento.
Sobre esse assunto Suguiu e Bigarella (1990), afirmam que a deposição de canal
resulta principalmente as barras laterais e as ilhas aluviais. As barras laterais são formadas
predominantemente por depósitos de fundo e se formam próximos às margens. Em sequencia
passa a receber acreção vertical e cresce tridimensionalmente formando diques marginais ou
restingas que em muitos casos emendam com a restinga mais antiga, separado por pequenos
vales.
O transbordamento ocorre devido ao processo de deposição por decantação, nesse
mecanismo o maior volume de sedimento se deposita na margem formando restingas qie são
as elevações do terreno onde os moradores ribeirinhos fazem suas plantações e moradias
(Suguiu e Bigarella, 1990).
A deposição ocorre durante o período das cheias, com transbordamento parcial ou
total. Durante a cheia rio deposita grande volume de sedimentos sobre as áreas deprimidas da
planície, fazendo com que lagos, lagoas e canas se tornem rasos ou desaparecem
completamente (Carvalho 2006; 2012), acarretando sérios problemas ambientais e sociais.
2.3 Tipos de Rios da Amazônia.
As propriedades ópticas das águas e sua produtividade, na Amazônia se reconhecem
pela aparência, três tipos fundamentais: água preta, branca e as destituídas de tintura ou carga
suspensa. Os rios de água branca, barrenta, conduzem em suspensão teor elevado de
partículas rochosas vindas de processos erosivos. Profundidades limites de visibilidade são de
menos de 10 cm a 50 cm (SIOLI, 1985). Nascem na região Andina e pré-andina, onde o
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processo erosivo é bem intenso e a carga de sedimentos em suspensão é alta (JUNK, 1983).
São de grande relevância as características dos tipos de rios para essa pesquisa.
Os de água preta são pobres em sedimentos, mas tingida por substancias procedentes
de áreas humíferas. Assemelham-se, no leito fluvial, a café preto e, no copo a chá fraco, com
profundidades limites de visibilidade variando de 1,5 a 2,5 m, exemplo clássico o maior rio
preto, o Rio Negro (SIOLI, 1985, p. 31). Com nascentes nos escudos arqueados das Guianas e
Brasil Central ou nos sedimentos terciários da Bacia Amazônica, onde os processos erosivos
são pouco intensos e reduzidos ainda mais pela densa floresta pluvial, justificando a
transparência das águas devido ao reduzido transporte de sedimentos, e a coloração escura das
águas, devido à decomposição de matéria orgânica (JUNK, 1983).
O Rio Amazonas, destaca-se dentre outros, pela grande extensão e vazão. Suas
cabeceiras estão no Peru, entre os montes Mismi e Kcahuich, ao sul da cidade de Cuzco,
próximo ao lago andino Titicaca, sendo o maior rio do planeta em volume de água e em
extensão com 7.100 km. Com características hidráulicas únicas do mundo, com incomparável
volume de água, resulta necessariamente de sua bacia estar dentro de uma das zonas de maior
pluviosidade do planeta (CARNEIRO, 2004).
Pode-se afirmar, de um modo geral, que a porção de montante da ilha do Careiro é a
mais antiga e a de jusante (crescida graças à tessitura de restingas do rio Amazonas,
por um lado, e do Paraná do Careiro, por outro), a mais jovem. Explicando assim o
porque dos terrenos altos da ilha se encontram a montante, diminuindo as cotas
águas abaixo. Nítido ao longo do litoral do Amazonas, onde as faixas de terras
alteadas junto ao rio, já não muito larga na Terra Nova, se estreita ainda mais para
jusante, a ponto de não sustentar qualquer parcela representativa da população.
(Sternberg, 1998, pág.87)
2.4 Planície de Inundação
Ao longo da calha do rio Amazonas um elemento bem marcante com relação a sua
paisagem hidrográfica está a sua planície fluvial Holocênica, uma unidade geomorfológica
controladora em sua dinâmica e regime fluvial. Conhecida regionalmente como várzea
amazônica, com formas extensas e áreas baixas ao longo de sua calha e seus afluentes de água
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branca que correspondem a 1,5% da Amazônia em território brasileiro, com uma área
estimada de 64.400 km2 (SOARES, 1989, p. 102). “As águas correntes são reconhecidas
pelos estudiosos como o agente geomórfico fundamental, haja visto o uso da expressão
“modelado de erosão normal”, para significar as formas do relevo em cujo aperfeiçoamento
elas tiveram o papel principal” (Sternberg, 1998, pág.14).
Essa planície está em processo de formação desde o início do Holoceno. É uma
unidade geomorfológica caracterizada por um complexo e dinâmico sistema flúvio-lacustre,
submetida diretamente ao controle do rio Amazonas, principalmente em função do
transbordamento parcial ou total que acontece anualmente nos meses de junho e julho.
Nascimento, Mauro e Garcia (1976, p. 145-146), caracterizaram esse complexo
sistema flúvio-lacustre como sendo formada por paranás, furos, igarapés, vales fluviais com
foz afogada, lagos com forma e gênese diferenciadas, diques aluviais, áreas de inundação e
constantemente alagadas.
Nessa unidade se encontra com freqüência tipologias como paranás, furos com tipos e
gênese direfentes, vales fluviais, díques aluviais (restingas), lagos com forma e gênese
diferentes etc (CARVALHO, 2012).
Diante do contato do rio Amazonas com a unidade geomorfológica presente, ocorrem
erosões aceleradas em suas margens como uma das suas principais responsáveis
transformações da paisagem ribeirinha. Na Várzea do Careiro Sternberg observa que elas não
apenas esculpem as formas do relevo, cinzelando e removendo o material da litosfera, mas
são responsáveis pela própria criação do terreno, o qual submetem a constantes retoques
(Sternberg, 1998, pág.15).
Critérios utilizados por Iriondo (1982) como um critério denominado por ele de
descritivo-genético, identificando na área de estudo duas subunidades geomorfológicas:
“depósitos de inundação” na parte interior da unidade e de “planície de bancos e meandros
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atuais” na zona de contato direto com o rio Amazonas. A planície de inundação identificou
como áreas planas e homogêneas, originadas por processos de colmatação ocorrendo durante
as cheias, formando assim lagos com formas e tamanhos diversos, também canais irregulares
muito pequenos. A planície de bancos e meandros atuais caracterizou como faixa de
sedimentos arenosos que o rio deposita dentro do canal durante a fase atual. As águas estão
diretamente ligadas com a vida dos ribeirinhos.
A enchente anual na região é o mais importante fenômeno da natureza a afetar a
ocupação do solo, como a variação sazonária do nível das águas. Na medida em que
satura, submerge ou deixa enxutos os terrenos, influi, não apenas sobre a extensão
dos solos utilizáveis, mas sobre a modalidade desse aproveitamento (Sternberg,
1998, pág.15).
2.5 Costa do Rebojão (AM)
A Costa do Rebojão11, pela sua posição em relação ao rio Solimões recebe o impacto
hidráulico quase que frontal do rio Solimões, provocando o Sternberg chama de
macroturbilhonamento, retirando material do fundo para a superfície, em movimentos
ascendente, helicoidal; com a capacidade de erodir, transportar e depositar sedimentos em
suspensão e das margens.
Nessa costa a velocidade do avanço das terras caídas é muito significativa, acarretando
em perdas e desvalorização de propriedades, o que ocasiona transtornos para os moradores
ainda resistentes nessa margem. Grande quantidade desse material erodido na costa do
Rebojão é transportado e depositado na curva seguinte do rio, denominada de Costa da Terra
Nova.
Essa costa passa por processo de desconstrução para construção, onde existia uma
comunidade que se deslocou para outras áreas devido ao intenso processo de erosão fluvial,
ocasionando a perda de suas terras. Por essa razão na Costa do Rebojão existem poucos
moradores, se tornando em áreas de pecuária e algumas famílias de pescadores e agricultores.
1 - Rebojão vem de rebojo, termo que na região se refere a turbulência provocado pelo movimento aleatório das
correntes fluviais.
20
Esse processo que bem poderia ser chamado de “dialética da natureza” onde há perda e
ganho, relação sociedade-natureza, mudando a estrutura da paisagem, transformando a
sociedade em seus hábitos diários.
Carvalho (2006; 2012) demonstrou que as terras caídas nas margens do rio Amazonas
resultam de processos complexos e interdepende de uma ação conjunta de fatores como a
pressão hidrodinâmica e hidrostática, composição do material depositado na planície de
inundação dos rios de água branca, fatores neotectônicos, estruturais e climáticos; antrópicos:
desmatamentos das margens e ação das embarcações como navios.
Os processos erosivos mudam a paisagem e alteram o cotidiano dos moradores,
conhecida regionalmente como terras caídas, na região Amazônica. As terras caídas,
desempenham um papel importante na transformação da paisagem ribeirinha, pois provoca
mudança muito rápida na paisagem, alterando o cotidiano dos moradores das margens do rio.
Por ser um rio de água branca é considerado muito instável, pois estão constantemente
transportando seus sedimentos e mudando seus leitos, influenciando o modo de vida dos
moradores ribeirinhos. “Sobressai a água, exclusivamente sua atividade que derivam as
formas do terreno e a ela se vincula ainda, direta e indiretamente, a fisionomia vegetal da
área” (Sternberg, 1998, pág. 243).
As variações sazonais obrigam o homem a constantes ajustamentos; é através dessas
pulsações da paisagem que mais claramente aparecem as vinculações da
coletividade com o meio. Rompe a monotonia da planície e cria duas paisagens
diferentes, subordinando os seres humanos as suas atividades. (Sternberg, 1998,
pág.245)
2.6 Comunidade Terra Nova (AM)
Na Comunidade Terra Nova, município do careiro da Várzea (AM) percebe-se a
importância da dinâmica fluvial, pois esta é responsável pelo aumento na área das casas dos
moradores, o que não torna necessário relocar suas moradias como acontece na comunidade
mais a montante, na costa do Rebojão. Esse processo de deposição ocorre com grande
21
frequência, com sedimentos na frente onde predomina a restinga nova, resultado anual de
deposição, ficando alta e fazendo os moradores migrarem para frente. Através disso, percebe-
se na pratica a dialética da natureza onde nada se perde ou ganha, apenas é transformado, ou
seja, a costa erodida no Rebojão é depositado em sua maior parte na comunidade terra nova
favorecendo os seus moradores. É de se considerar ainda o fato de que a ocupação da várzea
sempre foi maior nas bordas das ilhas e nas proximidades das margens onde o processo de
deposição é maior, elevando o nível das restingas e oferecendo as melhores condições de
moradia. (CARVALHO, 2006, Pag. 101). As casas assim obedecem ao ciclo hidrológico, se
mantendo afastados das áreas alagadiças, sendo essas, utilizadas apenas para a agricultura de
subsistência ou familiar. A utilização desse novo ambiente ocorre sem nenhum tipo de
conflito e está sobre a responsabilidade do pai ou chefe de família. (CRUZ, 2007 PAG.114 -
115).
Na ilha da Terra Nova, num perfil de até 19,8m de profundidade que corresponde a
depósitos em crescente, a datação de fragmentos orgânicos sugere uma idade de
2840+-80 anos AP. Indicam que as ilhas de Terra Nova e Careiro tem estado na sua
presente posição pelo menos nos últimos 2050 +- 120 anos AP. A evidencia atual
desta estabilidade é indicada nos antigos depósitos de barras em crescente
colonizados pela vegetação e truncados por canais atuais. Além disso, as barras
arenosas atuais não seguem as direções de migração dos antigos conjuntos de barras
em crescente. Desta forma, admite-se que o rio Amazonas passou por uma fase
meandrante que evoluiu ainda em tempos holôcenicos para o padrão anastomosado
atual. (ROZO, pág.82)
As culturas instaladas nessa comunidade são de ciclo curto (couve, alface, cebolinha),
e culturas anuais como o milho e mandioca, essas geralmente cultivadas na restinga antiga.
Alguns depósitos chegam a medir 300 de altura no sentido transversal do rio (CRUZ, 2009).
Os depósitos mais elevados podem ser instalados casas temporárias, para aproveitar a
fertilidade natural das novas terras, realizando plantios de bananeira e arvores jovens
frutíferas. Nos depósitos de sedimentos trazidos pela água do rio durante as cheias, onde se
formou a verdadeira restinga, os camponeses-ribeirinhos se estabelecem com moradias e
outros equipamentos (casa de farinha, galinheiros) e culturas de ciclo curto (CRUZ, 2009).
22
A comunidade possui energia elétrica e por esse motivo a metropolização dá-se inicio
com a aquisição de eletrodomésticos e televisores o que propiciam o consumo de produtos
industrializados e a mudança de hábitos antes rotineiros dos moradores, como a televisão que
modifica aspectos como horários rotineiros, cultura e etc. Quanto a dinâmica dos rios, a
explicação para o grande depósito de sedimentos se dá pela sua localização, já que encontra-
se em área de calmaria, de baixa velocidade do fluxo fluvial e pouca ou nenhuma erosão,
estas características favorecem a constante sedimentação da margem e a formação de novos
diques marginais, as deposições ocorrem com maior intensidade em períodos de vazante do
rio, exibindo inúmeras unidades morfológicas. As casas estão fixadas em áreas mais altas,
antigas, nas áreas mais atrás da comunidade, sítios e restingas mais antigas. A comunidade da
várzea amazônica é constituída por áreas comuns como: igreja, escola, campo de futebol e
uma sede comunitária, representando a centralidade da comunidade no que se refere à
decisões.
O processo de propriedades/posses é interpretado de acordo com legislação brasileira
como bens da união, uma concessão de uso com processo de compra e venda normal. Não
podem ser tituladas tampouco privadas. Porém essas terras de várzea vêm sendo negociadas
em modo particular, com processo de compra e venda há várias gerações. Seus preços são
calculados de acordo como o mercado capitalista usa, se um terreno estiver próximo ao lago,
ele será valorizado do que outro mais distante, mesmo apresentando fertilidade igual. A
valorização do terreno na várzea amazônica vai alem da benfeitoria que existe nele, pelas
condições de produção e sim pelo conjunto de condições comunidade/localidade, (CRUZ
2007).
É possível assim visualizar um dos padrões de organização do espaço amazônico rio-
várzea-floresta. Isso mostra a articulação e combinação do sistema: extrativismo da floresta, a
pesca e a agricultura; e hoje um novo método de pasto para criação de gados e produção de
23
gramíneas. Essas gramíneas são muito produtivas e nativas, favorecendo para alimentação do
gado, em quantidades significativas de animais para engordá-los. Com essa combinação é
possível observar um maior enraizamento dessas populações nessas áreas, fazendo da
organização social do espaço geográfico da Amazônia não somente no interior das florestas,
mais também em suas várzeas, com uma parte para comercialização e outra para subsistência,
assim uma paisagem tipicamente caboclo ribeirinho.
A zona de deposição consiste na sedimentação da parte inferior da restinga, favorecido
pela baixa declividade, devido ao curso médio das águas do rio e do material por ele
transportado. Nestas áreas de várzea encontram-se espécies de oirana, ou vegetação pioneira,
sendo esse o principal indicativo de deposição recente, porem esse tipo de vegetação, por ser
pouco competitiva, não se mantém por muito tempo, permanecendo até o aparecimento de
outras espécies de vegetação.
Sternberg no estudo realizado na aérea do Careiro da Várzea, cita sobre o processo de
deposição:
O homem não se limitou a aproveitar as terras alteadas pela natureza, por intermédio
das brechas de extravação há vários exemplos de campos que foram formados
graças à colaboração da água e do homem. A operação consiste em guiar as águas
ricas em sedimentos para baixios de argila compacta que se estendem à retarguarda
da restinga fronta. Para consegui-la cumpre atravessar a crista justafluvial por meio
de uma brecha, que imita as da natureza. (1956, p.80)
O conhecimento dos camponeses-ribeirinhos mostra sua capacidade de se adaptarem e
manterem estratégias para sua permanência nas áreas de planície de inundação, adaptação no
ambiente, com capacidade de se transformarem, desenvolverem tecnologia de subsistência,
além de transferirem seus conhecimentos ao longo das gerações.
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3. METODOLOGIA
Com o intuito de compreender a ocupação do espaço geográfico com uma análise
espaço-temporal, o projeto foi desenvolvido com apoio de levantamento e revisão de literatura
bibliográfico, pesquisas e levantamento de dados em gabinete e in locu.
A costa do Rebojão está inserida na ilha do Careiro, é toda formada pela planície de
inundação. Iriondo (1982) identificou duas subdivisões geomorfológicas na ilha. Na parte
oeste até a metade da ilha onde o autor mapeou como sendo de depósito de inundação,
enquanto que na parte leste é de planície de bancos e meandros atuais (Figura 2). A parte
oeste da ilha é mais antiga enquanto que a leste é mais recente.
Figura 2 - Mapa geomorfológico da ilha do Careiro conforme Iriondo, 1982.
O mapeamento do avanço linear do rio Solimões/Amazonas na costa do Rebojão foi
realizado a partir da utilização de imagem do satélite LANDSAT recortado do Google Earth e
sopreposto com mosaico de fotografias aéreas levantadas em fevereiro do ano de 1952 pelo
Serviço Aerofotogramétrico Cruzeiro do Sul, na escala reduzida para 1:55.000
(STERNBERG, 1998. p. 52/53).
Em campo foram realizadas entrevistas com moradores, registro fotográfico e
medições batimétricas.
25
Nas entrevistas com os moradores ribeirinhos, não foi determinados perguntas prévias,
mas conversas informais a fim de deixar os entrevistados tranquilos no decorrer da
conversação sobre o local de estudo. Observou-se como o período da cheia muda a paisagem
na comunidade (Figuras 3 e 4), alterando o dia a dia dos moradores ribeirinhos, comprovando
sua capacidade de adaptação e permanência nas planícies de inundação.
Figura 3: Comunidade período da cheia. Figura 4: Comunidade período da cheia
Fonte: Luciana Maia, 2014. Fonte: Luciana Maia, 2014.
A batimetria transversal dos rios Amazonas com o rio Negro (encontro das águas) foi
realizado utilizando-se um ecobatímetro da marca Raymariner (Figura 5). Com o sensor preso
a uma vara a 70cm de profundidade (Figura 6) e o barco se deslocando a velocidade média de
6km/h, onde a cada 10” eram registrados dados do visor. A medição foi realizada do limite da
costa do Rebojão com a Terra Nova para a margem oposta no lugar denominado de Lages.
Figuras 5: Ecobatimetro Figura 6: Sensor preso a uma vara.
Fonte: Luciana Maia, 2014. Fonte: Luciana Maia, 2014.
26
Em gabinete foi realizado sobreposição de imagem de satélite LANDSAT com
fotografia aérea do ano de 1952. A sobreposição da imagem do satélite LANDSAT com os
mosaicos de fotografias aéreas registradas no ano de 1952 nos permitiram observar e
mensurar a intensidade com que o rio Solimões/Amazonas adentrou na costa do Rebojão.
A memória dos moradores antigos da área confirma a velocidade com que o rio
Amazonas chegou ao lago do Joanico, cuja distância do mesmo para o rio
Solimões/Amazonas era de 1.450m em 1952 até 2010.
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4. RESULTADOS
Um dos resultados mais expressivos da pesquisa foi verificar a velocidades com que o
rio Solimões/Amazonas avançou na costa do Rebojão provocando o deslocamento no sentido
jusante da costa do Rebojão (Figura 7).
A sobreposição de imagem de satélite Landsat do ano de 2010 com fotografia aérea do
ano de 1952 mostra que em 58 anos o avanço do rio Solimões no trecho mais crítico da
margem direita (costa do Rebojão) foi de 1.450m, significando que a erosão lateral evoluiu
em média 25m/ano.
Figura 7: Sobreposição de imagens, com avanço da erosão e deposição da área de estudo.
Fonte: Google Earth. Org. André Zumak, 2015.
Enquanto isso na costa da Terra Nova formou-se uma nova e grande barra lateral
(restinga) de aproximadamente 5km de comprimento e chegando a 300m de largura. Essa
restinga segundo Cruz (1999) formou-se nos últimos de 50 anos. É nessa terra nova (restinga)
28
que os moradores praticam sua agricultura de ciclo curto como pode ser observado nas figuras
8 e 9.
Figura 8- Plantio de hortaliça na restinga nova. Figura 9: Observar as casas ao fundo da foto, na restinga
Foto: Alberto Carvalho em janeiro de 2015. antiga. Foto: Alberto Carvalho em janeiro de 2015.
Enquanto que na costa do Rebojão a situação é inversa. Naquele trecho a pressão
hidráulica do rio é muito intensa que associado ao macroturbilholamento das correstes fluviais
intensifica o fenômeno das terras caídas conforme podemos observar nas Figuras 10 e 11.
Figura 10 e 11: Paisagem comum na costa do Rebojão. A foto A mostra a margem com deslizamento e
escorregamento longitudinal. Em B observa-se casas de moradores já ameaçadas pelas terras caídas.
Fotos: Alberto Carvalho.
A pesquisa constatou que a diferença na forma de ocupação do espaço está
estritamente relacionada com a dinâmica fluvial. A raridade de moradores na costa do
Rebojão se explica pela dificuldade de acesso ao rio devido a margem ser muito íngreme e
pelos riscos de vida que as terras caídas oferecem aos moradores, enquanto que na costa da
Terra Nova a situação é inversa. Ali os moradores se sentem seguros do ataque do rio.
A B
29
Com as sobreposições de imagens de 1952 e 2015 (figura 12), observa-se a alteração
espaço temporal da área de estudo, com avanço das terras caídas nas margens da costa do
Rebojão, obrigando a mudança dos moradores para longe das margens, ou até mesmo saída
dos mesmos para outra localidade, evitando assim tragédias ou catástrofes.
Figura 12: Sobreposição de imagens, com avanço da erosão e deposição da área de estudo.
Fonte: Google Earth, 2015. Org. André Zumak.
Nas entrevistas alguns moradores informaram que sentem muito o impacto com a
cheia, por causa do transporte apenas fluvial, limitando o ir e vir. Além de perceberem a
diminuição dos peixes, onde antes era abundante agora se encontra escasso, restringindo
alimentação em período de cheia. Alguns moradores ao perderem suas terras na costa do
Rebojão, migraram costa da Terra Nova em busca de habitação e cultivo para subsistência.
Na costa do Rebojão as implicações são ainda maiores, pois estão sempre inseguros
com tensão em perder suas casas e bens e posteriormente precisam mudar de lugar as suas
30
moradias onde seja seguro. São perdas econômicas, sociais, além do risco de vida em que
estão expostos, criando muitas vezes problemas psicológicos e de saúde. Algumas soluções
existem em construir suas moradias em flutuantes, ou se mudar para outros lugares.
Importante ressaltar que os próprios moradores já conhecem e identificam algumas
características quando um terreno está sendo afetado pelo processo de erosão das terras
caídas. Antes do processo se completar eles tomam suas próprias providencias e saem do local
para evitarem tragédias. Os moradores ribeirinhos entendem a dificuldade de controle das
terras caídas, importante levar em consideração seus conhecimentos empíricos para a
sobrevivência de suas famílias, até mesmo para compreensão de análises técnicas locais.
A batimetria transversal realizada entre os rios Amazonas com o rio Negro (encontro
das águas), a medição foi realizada do limite da costa do Rebojão com a Terra Nova para a
margem oposta no lugar denominado de Lages. Foi utilizado um ecobatimetro e um sensor
preso a uma vara a 70cm de profundidade , com o barco se deslocando a velocidade média de
6km/h, onde a cada 10” eram registrados dados do visor. Os dados foram inseridos numa
tabela, e posteriormente lançados em gráficos para montagem do perfil transversal para sua
melhor compreensão.
Figura 13: Perfil transversal do encontro dos rios Negro e Solimões/Amazonas.
Fonte: Trabalho de campo, 08/2014. Org. Luciana Maia
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5. CONCLUSÃO
Ao final da pesquisa constatou-se que a irregular distribuição espacial da população na
área estudada está diretamente associada à dinâmica fluvial, mais especificamente resulta do
intenso processo de erosão e deposição lateral na área da pesquisa.
Na costa do Rebojão há poucos moradores devido ao intenso desbarrancamento das
margens, que pela grandeza de escala, coloca em risco a vida dos moradores. Segundo
depoimento de moradores mais antigos já houve vítima fatal quando uma senhora que, não
atentando para o risco, foi tragada pelas águas devido ao deslizamento repentino da margem.
Enquanto que na costa da Terra Nova o processo é inverso. Naquele trecho a
concentração de moradores é bem acentuada, pois as pessoas vivem em tranquilidade em
relação ao risco das terras caídas. Em trabalho de campo constatou-se que ao longo da
restinga mais antiga as casas estão muito próximas uma das outras. Naquela costa observou-se
que os moradores usufruem de certa infraestrutura como iluminação pública, água encanada,
comércio, escolas, área de lazer como sede dançante e campo de futebol.
Pelo exposto ficou claro a diferença da organização espacial dos moradores da costa
do Rebojão para a costa da Terra Nova em função da morfodinâmica fluvial do rio Amazonas.
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REFERÊNCIAS
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SUGUIO, Kenitiro e BIGARELLA, João José. Ambientes Fluviais. Florianópolis: Editora da
UFSC: Editora da UFPR, 1990.
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CRONOGRAMA
Nº Descrição Ago
2014
Set Out Nov Dez Jan
2015
Fev Mar Abr Mai Jun Jul
01 Levantamento e revisão
bibliográfica X X X X X X X X X
02 Coleta de dados em
campo
X X X
03 Análise dos dados de
campo
X X X X
04 Tratamento de dados
de sensoriamento
remoto
X X
05 Redação do relatório
final
X X
06 Entrega do relatório
final
X